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Da freguesia de Sernancelhe fazem parte outras faixas
territoriais. Pensemos na Ponte do Abade. As más línguas fazem originar a
construção da ponte de feição românico-gótica, reconstruída e alargada no
século XIX, na facécia do abade de Sernancelhe, que tendo a amiga do lado
de Aguiar, mandara construir a ponte para poder transitar em visita à
santa da sua devoção. Pena é que as mesmas línguas não tenham aposto as
mãos à organização de homenagem condigna à “amiga do abade” ou um
monumento em memória da mesma personalidade!

Mas o território de Sernancelhe estende-se ao longo da margem direita do
Távora. Num contexto de vigência cistercience, o abade do Mosteiro de São
Pedro das Águias, por procuração do abade de Salzedas, outorgou na
escritura que ordenava a edificação de uma ponte. E os motivos são da
ordem de cominicações, trânsito, transportes… A denominação exacta fica
por conta do leitor Estávamos perante a necessidade de dotar de condições
aceitáveis para o tempo as carreiras de Guarda e Celorico da Beira para
Lamego e Salzedas, por um lado, e para Viseu, por outro. Esta localidade,
de nome Ponte do Abade, pertencente à freguesia de Sernancelhe, de que
hoje dista uns 6 quilómetros, ficou servida por uma linda capelinha
edificada à beira do Távora, dedicada a Nossa Senhora do Amparo. A sua
escultura, dadas as características mórficas, insinua a Senhora do Ó ou da
Expectação, figura pré-natal, e originou a festividade que localmente se
celebra no dia 18 de Dezembro.

Mas no verão, habitualmente no segundo Domingo de Agosto celebram-se
fulgurantes festas populares revestidas de religiosidade, som e cor –
motivo para o reencontro dos filhos da terra, que a vida tornou dispersos,
e para a afluência massiva de forasteiros de muitas proveniências.
Mas a Ponte cresceu e fez crescer. O casario distribuiu-se por uma e outra
margem. A definição administrativa do liberalismo não olhou a situações
consideradas menores. A montante da ponte, sabemos que é freguesia e
concelho de Sernancelhe, distrito de Viseu, diocese de Lamego; a jusante,
freguesia de Sequeiros, concelho de Aguiar da Beira, distrito da Guarda,
diocese de Viseu; depois do pontão sobre a ribeira de Gradiz, voltamos,
com a zona da Fervença e com a mini-hídrica no Távora a substituir um dos
moinhos, à freguesia de Sernancelhe. Também pertencem a esta freguesia as
casa quintaneiras que se encontram na margem direita, a jusante da ponte
sobre o Távora.

E o espectáculo da divisão deu azo a que corressem alguns rios de tinta e
a de que de vez em quando surgissem problemas que os detractores faziam
avolumar, até por diversão. Hoje, a situação é badalada, quando se
levantam questões de ordem administrativa, quando os autarcas não dispõem
dos benefícios da civilização em tempo igual para os munícipes dos dois
lados, quando algum jornalista espreita a situação como um furo
jornalístico ou quando alguma família se indispõe contra outra, alegando a
divisão administrativa como pretexto.
A Ponte do Abade hoje configura uma localidade pujante, em termos
comerciais e de convivência. Não faltam as casas de diversão, os cafés e
restaurantes, pequenas unidades de indústria e serviços, a escola do 1º
ciclo, o jardim de infância, a igreja nova (inaugurada a 20 de Agosto de
1983), o cemitério moderno e espaçoso, com a capela do século XIX a
enquadrar os acto funéreos.
Como memória da pujança industrial de outrora fica patente a todos os
olhos a antiga fábrica da resina, que deu emprego a tantos e permitiu a
sobrevivência de muitos em tempo idos, sem se terem perdido ainda na bruma
dos lustros.
Da antiga albergaria, restam hoje, com lembranças apetecíveis: o pão de
qualidade e nomeada inquestionável, e o afamado bacalhau à Ponte do Abade.
E as migas de bacalhau ou a sopa de pedra trazem à colação e expressão da
arte culinária de alguns homens desta bem cosmopolita povoação e de que
fazem a delícia de alguns convívios informais.
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